LÂMINAS: O QUE COLECIONAR

Lâminas: O Que Colecionar.

Um roteiro para iniciantes e também para a reciclagem de colecionadores com dúvidas

_____________________________________________________Laércio Gazinhato

Felizes os atuais brasileiros que apreciam lâminas: nunca nosso país contou com tantas boas marcas sendo importadas, nem tampouco teve tantos cuteleiros artesanais! Hoje, aqui temos mais de 30 (trinta) excelentes marcas internacionais sendo importadas e 28 (vinte e oito) cuteleiros, a maioria trabalhando em regime “full time”. Ainda some-se a essa oferta toda o trabalho de 4 (quatro) “dealers” trazendo boas (e específicas) lâminas do estrangeiro.

Sem dúvida, esse panorama animador, como tudo na vida, tem dois lados e, felizmente, neste caso, a outra face não é ruim, mas deve ser bem entendida e, para isso, a melhor coisa me parece a ORIENTAÇÃO.

Tenho pouco mais de 50 (cinquenta) anos e desde os 19 (dezenove) estou direta e profissionalmente envolvido com lâminas. Faço do conhecimento e comércio delas uma de minhas principais fontes de renda. Como se diz na linguagem popular, “já vi muita água rolar” nesse segmento. Acompanhei (e ainda acompanho) colecionadores em suas diversas (e sempre constantes) fases.

Com este artigo, meu intuito é justamente evitar que Você passe pela pior (e totalmente desnecessária!) “ fase do ajuntamento”. OK, OK: somos todos humanos e gostamos de variar, o que muita gente diz que “é o sal da vida”, mas no colecionismo de lâminas esse é um sal grosso e que pode, comercialmente falando, trazer-lhe prejuízos. Para os totalmente iniciantes, a primeira providência é ler o artigo “Mitos Perigosos” em “Textos Selecionados” e evitar divulgar inverdades.

Por princípio e definição, uma verdadeira coleção – seja lá do que for – deve ter lógica e também começo, meio e fim. Este último, desejo eu para minha paixão por facas Bowie, nunca ocorra. Mas, eu mesmo me engano neste particular: como já vi ocorrer muitas vezes, há de chegar o dia em que venderei a maioria de minhas peças para outros apreciadores. Aliás, eu me preparo – e sugiro que todos sigam meus passos – para daqui uns 20 (vinte) anos vender as, digamos “peças menores” de minha coleção e ficar só com a “nata”, a “papa fina”. Como fazem uns 10 (dez) anos que eu não compro nada que não seja realmente superlativo, este será um trabalho bem árduo…mas, por outro lado, certamente fará a delícia de outros colecionadores.

“Henry Bowie”, super-clássica lâmina de aço carbono, com 9 polegadas de comprimento, e um tributo a D.E. Henry, o cuteleiro norte-americano que “re-inventou” as famosa Bowies de Sheffield. Exemplares assim clássicos e com esta evidente qualidade de manufatura e materiais sempre se valorizarão.

Para começar, vamos partir de duas hipóteses: 1) Você tem um “ajuntamento”, ou seja, um montão de lâminas de diversos tipos, estilos e/ou épocas, fabricantes, ou 2) Você tem uma ou duas lâminas e pretende, seriamente, começar uma verdadeira coleção, garantindo-se ao máximo quanto a liquidez do capital empregado.

Se Você está na primeira opção, meu conselho é um só: seja crítico ao máximo. Existe sentido em ter objetos similares porém sem relação de tipo, estilo, procedência ou idade entre si? Se sua resposta for afirmativa, por favor perdoe-me faze-lo chegar a ler até aqui. Mas, se Você estiver indeciso, peço-lhe: junte-se aos rapazes da segunda opção e …siga-me!

DECISÃO!

No colecionismo de qualquer objeto existem 2 (dois) fatores básicos que sempre influenciarão em sua rentabilidade e liquidez: são o esforço da reunião e a qualidade intrínseca do que é colecionado. O esforço da reunião de peças com lógica, sabemos, pode ser um tremendo prazer, desde que a pessoa se dedique com paixão e bom senso. Obter qualidade intrínseca é um pouco mais difícil, coisa que só o tempo e o “faro apurado” de cada um conseguirá. Certamente, com as coisas escritas a seguir Você irá economizar muito tempo.

Para começar uma verdadeira coleção de lâminas com todas as já mencionadas garantias existe um termo-chave que deve, sempre, estar em sua mente: DEFINIÇÃO CLARA. Assim, o primeiríssimo passo é definir claramente o que Você realmente mais gosta. E, atenção, não seja influenciado, pois por mais louca que seja sua paixão, ela irá fazer a sua felicidade e é muito provável que existam, ou existirão, outras pessoas com os mesmos gostos. Mas, atenção novamente, adicione uma boa dose de lógica ao que Você vai decidir. Não, não, não adianta nada Você me responder que gosta de lâminas em geral: do ponto de vista da lógica comercial futura, isto é errado! No futuro, Você vai perder dinheiro.

E se Você me disser que gosta tanto de canivetes quanto de facas, eu lhe respondo: ENTÃO, TENHA 2 (DUAS) COLEÇÕES, mas igualmente bem definidas e com a maior qualidade possível em cada uma delas. Sendo mais claro: VENDA TUDO, MAS TUDO MESMO, QUE NÃO FOR EXCEPCIONALMENTE BOM, SOB TODOS OS PONTOS DE VISTA! Faça a felicidade de colecionadores iniciantes, ou presenteie os parentes e amigos. E olhe que nas duas opções Você já está ganhando. Eu sei que é difícil, mas – creia-me – muito necessário se Você quiser ser um verdadeiro colecionador. Um dia, depois de ter a maior coleção do Brasil de facas Bowie “custom”, eu tive que fazer essa opção e hoje sou mais feliz por dentro, se é que me entendem…

Bowie dobrável, com lâmina de 4 1/2 polegadas e talas de empunhadura em marfim de elefante. São raras e caras, mas garantem cada centavo investido.

 

Roberto Gaeta (ou Bob’G, que é como assina suas criações) é o mais antigo cuteleiro artesanal do Brasil e tem uma frase que vem bem a propósito disto que estou escrevendo: “Ninguém em sã consciência coleciona restos de qualidade, seja lá do que for!” . Esta colocação, radical mas verdadeira, sintetiza a opinião de um homem de 65 anos, 40 deles profundamente envolvidos tanto em confeccionar quanto colecionar facas. Adicional e particularmente, considero Roberto Gaeta como o melhor cuteleiro “custom” de nosso continente.

ORIENTADO E… FELIZ!

Bom, então caso Você tenha resolvido mesmo depurar o seu “ajuntamento” ou resolvido ser um homem decidido quanto a iniciar seriamente uma coleção de lâminas, vem a questão mais difícil: o que verdadeiramente colecionar? Minha resposta é: o que Você quiser, dentro de sequências lógicas. Nunca, é claro, esquecendo de ter a máxima qualidade.

Aqui vai um exemplo daquilo que nunca deve acontecer: imagine um colecionador de lâminas militares originais que já tenha uma Ka-bar, um “kukri”, uma faca de trincheira M-3 e está desesperado para ter um punhal Fairbarn-Sykes; faz anos que ele o procura, mas não aguenta mais; um dia ele sucumbe e acaba comprando uma dessas horríveis réplicas feitas no Paquistão. Ele até pode justificar-se dizendo “Ah! Foi só para completar uma sequência; é melhor essa do que nenhuma, etc”. Nesse momento, perante um colecionador sério, este homem comprometeu o que poderia ser uma boa sequência de colecionismo. Em meu entender, o menos errado nesse caso – e totalmente compreensível e lógico já que não conseguia um original – era ele adquirir uma boa réplica desse famoso punhal inglês da 2ª Guerra Mundial, de preferência de procedência inglesa, que certamente custaria 5 ou 6 vezes mais do que a paquistanesa, mas – ainda dentro de sua desculpa para tal “fraqueza” – ele teria conseguido qualidade intrínseca.

Tenho um amigo norte-americano, Roger Baker, que coleciona um dos mais raros tipos de Bowies originais do século 19, as dobráveis. Em pouco mais de 20 (vinte) anos de colecionismo, conseguiu apenas 6 (seis) delas e tudo porque ele faz questão de que sejam realmente “mints”, ou seja, nunca usadas. Hoje, com o recente “boom” que as Bowies originais tiveram nos EUA, é difícil o mês em que Roger não recebe uma proposta de compra de suas dobráveis. A última foi de um amigo comum que, sei, ofereceu US$ 90,000.00 pelo lote e nem assim Roger as vendeu. Bom, conhecendo-as e se eu fosse um homem rico ofereceria até mais, pois na qualidade delas por enquanto não se conhecem outras.

No verdadeiro colecionismo (novamente seja lá do que for) aquela máxima brasileira de que “a economia é a base da porcaria” é mais verdadeira do que nunca. Assim, é sempre preferível ter menos mas melhores peças. O segredo de boas coleções não é a quantidade, mas sim a qualidade do que se reuniu.

SEQÜÊNCIAS DE COLEÇÃO

Para melhor compreensão, esta parte de minha explanação tem que ser dividida em 2 (dois) tópicos: sequências difíceis e sequências fáceis.

As sequências difíceis são dificeis em todo o mundo e, assim, uma vez devidamente montadas, por pequenas que sejam e ao contrário do que Você possa pensar, são as mais rentáveis e de maior liquidez. As sequências difíceis são o que as pessoas ricas, bem postas na vida e com cultura desejam ou irão desejar, influenciadas por fatores cíclicos, tais como divulgação e valorização constantes, antiguidade e raridade natural. Estas sequências, atualmente, no mundo todo e por ordem de grandeza, são:

  • Bowies inglesas e norte-americanas do século 19
  • Canivetes antigos com grande carga de trabalho artesanal
  • Espadas e outras lâminas japonesas até 1860
  • Facas “custom” de cuteleiros de grande reputação
  • Lâminas medievais originais

É fácil comprovar isto: basta ler os artigos de maior destaque das 3 (tres) principais revistas de lâminas do mundo: as norte-americanas “Blade” e “Knives Illustrated” e a francesa “Excalibur” , sucessora da famosa “Gazette des Couteaux”. Enfim, a mídia do segmento as cita com frequência e isto as torna desejadas. E porque isto acontece? Ocorre que estes tipos e estilos de lâminas são (ou no caso das “custom” serão) os clássicos originais, verdadeiros ícones de modelos consagrados, atualmente em quantidade muito pequena em relação ao crescente número de pessoas cultas e ricas que o mundo da atualidade tem. Assim, nesse caso a oferta é muitissimo menor que a demanda e isto torna díficil sua aquisição, daí a constante valorização e consequente liquidez.

Entretanto, não deve o caro leitor imaginar que só os ricos ou cultos podem iniciar uma sequência difícil de coleção de lâminas. Eu mesmo sou um exemplo disto: não sou (e já não dá mais tempo de ser) rico, tenho apenas média cultura e no entanto tenho a maior coleção de Bowies originais do Brasil, a 2ª maior do continente, embora distante anos-luz da primeira. Como as consegui? Simples (e aqui vai uma grande “dica”): procurando fora dos grandes centros e usando meios que apenas demandavam tempo, coisa que, normalmente, os ricos não têm. No passado, eu ia ver tudo o que me informavam sobre Bowies originais e a taxa de aquisição, na melhor das hipóteses, era de uma adquirida para cada dez vistas; nos últimos 5 (cinco) anos elas estão muito mais raras e no ano em que consigo comprar uma, boa e a bom preço, já me dou por feliz! Como já tenho a maioria das que pretendia, é mais fácil contentar-me com isso…

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Veja em “ARMAZÉM ON LINE – Itens Antigos” facas e canivetes do passado e modernos que são altamente colecionáveis

Atualmente, iniciar uma sequência fácil é mais sábio e pode, perfeitamente, servir como uma preparação para “vôos mais altos”. E de modo algum isto significa ausência de rentabilidade ou liquidez: ao contrário, em nosso país pode significar grande e certa valorização. Quer um exemplo? Quem hoje não quer ter uma faca da marca Mundial sem uso? Prematuramente extinta em 1984, essa boa linha nacional de facas esportivas ainda é comentada com saudades pelos mais velhos e desejada por muitos iniciantes. Afinal, sem qualquer temor, pode-se afirmar que a Mundial foi a Marbles brasileira…E olhe que nos EUA voltaram a produzir as Marbles, o que valorizou tremendamente os exemplares originais (veja artigo sobre exemplares raros da marca Mundial).

Como não tenho bola de cristal, fica difícil fazer uma acertiva e escrever colecione isto ou aquilo moderno, mas – pela lógica do que já vi acontecer e pelo que acontece em outros países – posso recomendar 2 (duas) linhas:

  • Facas artesanais de bons e reputados cuteleiros
  • Cutelaria comercial importada de boa qualidade

Para a primeira linha, é indispensável Você definir previamente o tipo que vai colecionar (Bowies, Utilitárias, de Combate, etc.), ter um pouco mais de dinheiro e paciência, pois essas lâminas são totalmente artesanais e todos os nossos cuteleiros (como a maioria dos cuteleiros “custom” do mundo) tem uma fila de espera, que em alguns casos pode chegar a 8 (oito) meses. Nos EUA, fácil, fácil as criações de alguns nomes consagrados chegam a ter fila de espera de 10 (dez) anos! (para histórico de nossa cutelaria artesanal, veja o artigo “Origens da Cutelaria Artesanal Brasileira”)

Um ponto importante das modernas facas artesanais é que elas também podem classificar-se – dependendo do acabamento, da qualidade, dos materiais empregados e do nome do cuteleiro – em obras de arte em aço. E, como ocorre com toda obra de arte que demanda tempo em sua confecção, uma vez concluída a ela é agregado um outro valor pelo fato de já estar pronta e disponível.

Obviamente, o tipo de aço e o material de empunhadura influem decisivamente no preço final. Até o final de 1999, o chifre do veado indiano Sambar (o melhor comercialmente disponível para empunhaduras de facas) era um material habitual; no inicio de 2000 a Índia restringiu a exportação desse material e, de um dia para o outro, em todo o mundo as facas com esse material valorizaram 10% (dez por cento). Marfim sempre foi o mais caro material para a empunhadura de uma lâmina, mas de 10 (dez) anos para cá seu preço tornou-se verdadeiramente abusivo e a tendência é de que ficará ainda mais estratosférico…

Leia também “Guia de Aços…”

 

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Veja em “ARMAZÉM ON LINE – Itens Modernos – Cutelaria Custom” criações de Roberto Gaeta (Bob’G), Jimmy Lile, Ricardo Romano, D’Alton Holder, Milton Padilha, Randall, Angelo Gaeta, McConnell, Luis Alberto Caporaletti, Centofante, Edmund Davidson, etc

Na segunda linha, a comercial importada de qualidade, é onde o iniciante poderá – mais imediatamente – reunir um bom acervo, com pouco ou razoável dispêndio de capital. Novamente, é imprescindível definir o(s) tipo(s) que irá colecionar. Neste caso, deve-se também estar preparado para uma valorização mais lenta, pois as peças são mais facilmente obteníveis. Esta segunda linha de colecionismo pode – e deve – dividir-se em facas e canivetes, nestes últimos devendo haver uma sub-divisão com tipos específicos, tais como: os com empunhadura de chifre de veado (normalmente mais caros), os do tipo tático (nos últimos 3 anos uma forte tendência), os Remington “Bulllets” (tantos e tão variados modelos que deles se poderia fazer uma coleção inteira!), etc.

Tenho um cliente de Campo Grande (MS) que, após colecionar por quase 20 (vinte) anos facas comerciais de qualidade, deu – a meu ver – uma de mestre: depurou sua coleção ficando apenas com exemplares que já haviam saído de linha. Vou dar apenas 2 (exemplos) de valorização dessa coleção, em dólares: 1) ele ficou com uma adaga Gerber Mark I com empunhadura cinza (produzida na época da Guerra do Vietnã) que eu mesmo lhe trouxe dos EUA por US$ 70.00 e hoje vale, por baixo e em qualquer lugar do mundo, algo como uns US$ 250.00; 2) igualmente, manteve uma Bowie Gerber com empunhadura “coffin” que pagou – há 5 anos e conforme a nota em seu poder – US$ 112,00 da época e hoje está cotada em cerca de US$ 200,00. Note que com a venda dos exemplares que não mais queria ele ainda fez caixa para futuras aquisições.

Os bons canivetes de reputadas marcas, ou de reputados artesãos, são um bom exemplo de um tipo de sequência fácil do colecionismo de lâminas que vem crescendo dia a dia em todo o mundo. São práticos, quase todos os esportes modernos exigem o concurso de um e, com o recente modismo “country” ou do prestígio da vida ao ar livre, tornaram-se quase indispensáveis. Alguém tem dúvida de que iniciar uma boa coleção deles seja rentável?

Exemplos como os fornecidos existem aos montões e ocorrem todos os dias. As idéias explanadas são apenas exercícios simples de lógica aplicada.

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Veja em “ARMAZÉM ON LINE – Itens Modernos” facas e canivetes das marcas Cold Steel, Buck, Gerber, Puma, Kabar, etc

Uma outra “dica” importantíssima, seja qual for a sequência de coleção pela qual Você se decidir, é ter a máxima literatura possível sobre o assunto. Embora a quase absoluta maioria dos livros sobre lâminas seja em idioma inglês, eles são ótimos referenciais fotográficos e, com o tempo, Você irá se habituar com os termos principais. Além disso, todos têm um amigo bem versado no inglês…Uma outra fonte dessa cultura específica é a Internet, pois cada dia mais empresas importadoras, colecionadores e “dealers” colocam páginas na rede brasileira, sempre com informações preciosas. Bom, todos sabemos, a cultura sempre descortina um mundo novo: hoje meus melhores clientes são aqueles que, ao lado das facas, adquiriram (e adquirem) os livros que, a duro custo, a Knife Company traz.

A Você, pessoa agora mais esclarecida e, creio, melhor orientada, resta somente refletir e decidir-se. Eu tive que aprender no método do erro e acerto, mas Você já leva duas tremendas vantagens: teve conselhos e, o que é melhor, tem muito mais o que escolher.

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